O Amor, vacina contra a pandemia da indiferença

Por Dom Antônio Fernando Saburido

Publicado em Comportamento | 08/02/2021

Neste momento, no qual todo mundo espera as vacinas contra a pandemia da Covid-19, cada vez mais descobrimos que precisamos superar também os vírus da desigualdade social, do racismo, do preconceito religioso e deste clima de intolerância que devasta a sociedade e não permite diálogo. Cada vez mais se torna urgente buscar algum antídoto para a epidemia do desamor e reencontrar motivos para retomar a fé na humanidade. Só assim poderemos alcançar a cultura da fraternidade humana e da amizade social, proposta pelo papa Francisco, em sua recente encíclica Fratelli Tutti.

Recentemente, o mundo recordou o aniversário do martírio do Mahatma Gandhi, assassinado na Índia, no dia 30 de janeiro de 1948 por seu testemunho de luta não violenta contra a discriminação de classes e por sua insistência no diálogo entre hindus e muçulmanos. Que a memória da sua vida e da sua mensagem de paz e não violência possam nos ajudar. Ele gostava de afirmar: “Este mundo tem todas as riquezas capazes de alimentar e sustentar a humanidade e todos os seres vivos. No entanto, é pouco demais para saciar a ambição dos prepotentes”. E a cada discípulo, insistia: “Comece por você mesmo a mudança que propõe para o mundo”.

Martin-Luther King e sua luta pela igualdade racial nas Américas.

Nas Américas, a luta pela igualdade racial nos Estados Unidos, conduzida pelo pastor Martin-Luther King, teve esse mesmo espírito. Na América Latina, muitos movimentos sociais têm se firmado neste método proposto por Gandhi: a não violência ativa como instrumento de luta pacífica pela justiça e pela libertação dos povos. Na Argentina, Adolfo Perez Esquivel, arquiteto, escultor e ativista cristão pelos Direitos Humanos, recebeu o prêmio Nobel da Paz. Também, em 1992, Rigoberta Menchu, índia Maya da Guatemala foi agraciada com o mesmo prêmio por sua luta pacífica pela libertação do seu povo e sua mensagem de esperança para todo o continente.

Neste domingo, 07 de fevereiro, a nossa arquidiocese recordou o aniversário de nascimento de Dom Helder Camara, que dedicou toda a sua vida a semear a cultura da paz, baseada na ação não violenta pela justiça. Ele gostava de afirmar: “Se, para serem levadas nos ombros, as pessoas te pesam, carrega-as no coração”.

Há quem pense na Espiritualidade como algo separado da vida. Ao contrário, a fé cristã nos assegura que este caminho se realiza pela graça divina e é totalmente gratuito e acessível a todos. Basta querer e aceitar o chamado divino que nos manda espalhar amor e solidariedade pelo mundo

Papa Francisco e a encíclica Fratteli Tutti: somos todos irmãos

Nesta próxima quarta-feira de cinzas, o Conselho Nacional de Igrejas Cristãs, o CONIC, que reúne sete Igrejas cristãs no Brasil, abrirá a 5ª Campanha da Fraternidade Ecumênica que tem como lema: “Fraternidade e Diálogo: compromisso de amor”. Há quem pense no amor como sentimento. Isso existe em determinada forma de amor que liga as pessoas apaixonadas. No entanto, mesmo neste caso, o amor vai além do sentimento. É atitude de vida, posicionamento interior, opção consciente que não depende apenas de emoções passageiras e sim, como ensina esta Campanha da Fraternidade, é compromisso de vida e caminho espiritual de amadurecimento humano.

Há quem pense na Espiritualidade como algo separado da vida. Ao contrário, a fé cristã nos assegura que este caminho se realiza pela graça divina e é totalmente gratuito e acessível a todos. Basta querer e aceitar o chamado divino que nos manda espalhar amor e solidariedade pelo mundo.

Conta o filósofo, escritor e pedagogo austríaco, naturalizado israelita – Martin Buber, no seu livro ‘Histórias do Rabi’: “Na tradição judaica, em uma noite na sinagoga, alguns homens estão sentados à espera do novo dia. Um velho sábio encontra-se rodeado por alguns discípulos. Então, o sábio pergunta: Quando é que nós conseguimos reconhecer o momento em que a noite se completa e o novo dia desponta? Um discípulo toma a palavra e diz: Quando as estrelas desaparecem no céu e a terra passa a ser acariciada pelos raios do sol. Não, responde o mestre. Outro discípulo corrige: Então, quando conseguimos distinguir à distância, sem qualquer dificuldade, um cão de um carneiro. Não, diz de novo o mestre. Mas quando então? Perguntam em conjunto os discípulos. Depois de um instante de silêncio, o velho sábio responde: Tu reconhecerás o momento em que o dia desponta quando, contemplando o rosto de um homem qualquer, nele reconheceres o teu próprio irmão. Caso contrário, no teu coração será ainda noite”. Guardemos no coração esse ensinamento e o pratiquemos.

Dom Antônio Fernando Saburido

Dom Antônio Fernando Saburido

Dom Antônio Fernando Saburido é o arcebispo de Olinda e Recife desde 2009. Ele nasceu em 10 de junho de 1947 no Cabo de Santo Agostinho, Pernambuco. Em 21 de março de 1978 professou votos religiosos como membro da Ordem de São Bento (beneditinos), sendo ordenado sacerdote em 17 de dezembro de 1983. Foi eleito bispo em 31 de maio de 2000.

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