
Será que vale a pena trocar o indexador dos contratos de aluguel?
Por Thiago Bezerra
O projeto de lei do deputado federal Vinicius Carvalho, do Republicanos de São Paulo, foi apresentado no dia 23 de março de 2021, determinando que o índice de correção dos contratos de locação comercial e residencial não poderá ser superior ao Índice Oficial de Inflação do País (IPCA), contudo, será permitida a cobrança acima do índice ajustado, desde que com a anuência do locatário.
O deputado alegou, em síntese que, apenas em 2020 o IGP-M teve uma correção de aproximadamente 25%, enquanto que o IPCA teve uma correção de 5%, e assim ao utilizar o IPCA como parâmetro para reajuste, seria uma forma de reajuste dos contratos, pois levaria em consideração o real custo de vida, mas deixaria a porta aberta para negociação entre as partes também.
A intenção do congressista é proteger o lado mais fraco da relação, segundo ele, o locatário, que fica à mercê das regras do mercado. Além disso, ainda houve um requerimento de urgência, apensado ao projeto, que, contudo, está desde o dia 7 de abril aguardando o parecer da Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania, mas que devido ao requerimento de urgência pode ser colocado para votação a qualquer momento no Congresso Nacional.
Agora que já foi explicado o objetivo do projeto e o seu andamento na Câmara Federal, vamos tratar um pouco mais dos detalhes técnicos como qual a diferença dos índices de correção, qual a periodicidade, o que é levado em consideração nesses índices, qual a opinião das entidades e os possíveis impactos no mercado imobiliário em caso de aprovação.
O Brasil precisa se tornar um local seguro para os investidores, com as regras do jogo claras e essas mudanças repentinas podem causar mais prejuízos a longo prazo do que benefícios imediatos aos locatários
O IPCA é o índice nacional de preços ao consumidor amplo, produzido pelo IBGE desde 1979, sendo inclusive utilizado como índice oficial de inflação no Brasil, levando em consideração um conjunto de produtos e serviços consumidos regularmente em diferentes cidades e regiões do país e é justamente aí que surge o primeiro imbróglio, pois o IPCA reflete a inflação do consumidor, sendo indicado para ajustes salariais e não para aluguel, segundo a Associação Brasileira de Incorporadoras Imobiliárias (Abrainc). Além do mais, esse tipo de intervenção iria causar mais insegurança jurídica para todo o setor, afetando proprietários de imóveis, fundos imobiliários e demais operações lastreadas em recebíveis imobiliários.
Já o IGP-M representa o índice geral de preços do mercado, medido pela Fundação Getúlio Vargas (FGV) e registra a inflação de preços desde matérias primas agrícolas e industriais até bens e serviços finais, desde 1989. Uma outra diferença, é que esse índice é abrangido por toda a população, sem restrição de nível de renda e sendo utilizado como referência nas tarifas públicas e planos e seguros de saúde, além dos contratos de locação.
Mais um ponto que chama a atenção, é que nos cinco anos anteriores à pandemia, o IGP-M e o IPCA andaram praticamente lado a lado, com uma diferença de apenas um ponto percentual. Ou seja, será que valeria a pena arriscar uma intervenção no setor que vem crescendo mesmo durante a pandemia, podendo dessa forma reduzir a expansão e consequentemente ter uma menor geração de impostos, diminuição da quantidade de trabalhadores na construção civil (de uma das áreas que mais emprega no país)? Isso sem falar que, em caso de aprovação do projeto de lei, as correções só seriam indexadas ao novo índice para os contratos assinados após a promulgação da lei, tendo em vista que a lei não poderia retroagir.
A Abrainc ainda informa que, no Brasil, temos aproximadamente 12 milhões de imóveis locados e destes, 75% dos locatários possuem apenas um imóvel e o utilizam como fonte de renda para sobreviver. Se incluirmos os fundos imobiliários, aumentaríamos esse número para mais 760 mil investidores como pessoa física, que dependem do pagamento do aluguel como complemento da renda.
Diante do exposto, a pergunta que fica no ar é: será que o Congresso Nacional chegou a analisar todos os impactos que essa mudança pode ocasionar no setor? Ou só estão tentando aprovar mais um projeto com o intuito de permanecer em destaque na mídia?
O Brasil precisa se tornar um local seguro para os investidores, com as regras do jogo claras e essas mudanças repentinas podem causar mais prejuízos a longo prazo do que benefícios imediatos aos locatários.
Com certeza, é preciso pensar nos estabelecimentos comerciais que estão fechados devido à pandemia e terão um considerável reajuste no preço dos imóveis comerciais ou ainda, nos locatários que tiveram as suas rendas afetadas por causa da crise sanitária atual e também terão reajuste nos seus imóveis residenciais, podendo ser inclusive enquadrados perfeitamente em casos fortuitos ou de força maior, como já foi decidido por alguns tribunais como o de São Paulo, Rio Grande do Sul e Goiás.
Contudo, a intenção desse artigo é que antes de qualquer mudança nos índices de correção pelos congressistas, que fossem pelo menos levados em consideração todos os impactos econômicos para o setor e o quanto dessa insegurança jurídica poderia atrapalhar o desenvolvimento do setor imobiliário em um dos momentos que mais precisamos impulsionar a economia novamente.
Muito bom o tema e o artigo.